terça-feira, 24 de agosto de 2010

Beija-Flor


Pra que mentir
Fingir que perdoou
Tentar ficar amigos sem rancor
A emoção acabou
Que coincidência é o amor
A nossa música nunca mais tocou.

O atraso do relógio fazia minha mente girar. Corria mais que meus músculos permitiam, queimava o cigarro em minhas roupas pelo movimento rápido de meus braços e quando cheguei, descobri que não tinha mais motivo para correr. Sentei-me ao chão e finalmente nicotinei meu corpo sem a pressa de um pulmão ardido. Demorei pouco mais de 60 segundos para notar a sua presença e temi a hora de lhe dizer bom dia. Disse-lhe como quem espera fugir da palavra e quando me questionou, disse-lhe tudo.

Se meu coração já palpitava de maneira arrítmica antes de lhe dizer bom dia, agora este parecia mexer como as asas de um beija-flor. E se me permite usar a palavra para citação, quando lhe olhei lembrei-me do poema - alguns consideram música, mas o que é a música senão um poema cantado? - você se lembrava deste poema e quando ainda não temia me esbarrar a você, você recitava-o todas as vezes que citávamos o nome do autor.

Você se lembrava da orelha fria e dos segredos de liquidificador, enquanto eu, quando me recordei meses depois desta mesma música, só conseguia lembrar do começo: motivos de mentira e motivos de perdão inexistentes. "A emoção acabou".

O incomodo era mutuo, o sofrimento pode-se dizer que também o era, no entanto cada pessoa sofre de sua forma e de sua maneira nada divina de lágrimas escorridas em desperdício de sons chorosos. Foram diversas camisas molhadas daqueles que não tinham motivos para tê-las.

Senti-me de algum modo iluminado por uma ideia, o que soa um tanto quanto ridículo, mas infelizmente (pela breguice das palavras utilizadas) era real. A ideia era o simples fato que, pela primeira vez em meses de ódio reprimido, podia dar um fim em tudo. Quando digo fim, refiro-me ao sofrimento que estava me mutilando. Não fingi mais o perdão, simplesmente o fiz e sem dificuldades maiores. Algo que, pensava eu, ser tão complicado e quase impossível, soou de maneira natural. Eu o fiz e pronto. Eu o fiz e libertei o que me ardia o peito.

Disse-lhe o que precisava dizer, abracei-o como um selar de acordo, apostei minhas fichas na ilusão que isso não mais ocorra. Esta parte digo ilusão por não poder ter certeza de que caminho tomará as suas próprias escolhas, pois as minhas as conheço de maneira cristalina.

A principio me senti incrivelmente tolo pelo fato de seguir esse caminho. Tolice foi a minha ao pensar isso. Mas é assim que meu corpo e mente agem, toda vez que faço decisões que parecem serem certas - pois sinceramente não há como ter certeza da própria certeza - sinto-me ridículo, depois me sinto bem.

Sinto-me bem, enfim. Sinto-me leve. Sinto-me livre. Agradeço você a isso. Somente.

Um comentário:

Estevão de Almeida disse...

Pronto!
Finalmente com o coraçãozinho um pouco mais livre, leve e solto!
Agora que conseguiu abrir um espacinho la dentro para algo novo, está finalmente livre, livre pra sentir raiva por outra pessoa!
Obrigado autora.