quinta-feira, 26 de abril de 2012

Prefácio


Queria saber como é o melhor modo de começar um livro. O fato é que gostar de ler e entender muito sobre esse universo, não tem conexão alguma com saber como começar sua própria história. Encontro frases soltas e até mesmo o que eu mais gostaria de compartilhar, mas como faço para começar com tudo isso?

Essa história será sobre uma vida, somada com curiosidades de outras tantas vidas, com pitadas de uma grande paixão. Como toda mulher com a minha idade (aquela entre os vinte e cinco e trinta e cinco) e da minha geração (essa que acha mais fácil compartilhar a vida em uma página na internet do que com seu melhor amigo), encontro grande dificuldade de buscar o caminho certo e às vezes a vontade de desistir bate a porta, dizendo-me com todas as palavras: Você não vai conseguir. A partir daí, para evitar essa depreciação, eu criei uma terapia, a terapia dos livros e das papelarias, assim sempre que me sentia mal, estava nas últimas da minha TPM, chorando abraçada com uma panela de brigadeiro de colher, eu saía e ia para minha terapia particular.

Estamos vivendo em uma era que a cultura está bem vagabunda, que ler um bom livro é sinal de intelectualidade, e não de simplicidade (como eu, particularmente, encaro esse “esporte”). Portanto é bem comum ver os mesmos diálogos sobre como uma pessoa ama livros, como outra ama escrever e todas essas baboseiras mentirosas, o fato é que as pessoas criaram a imagem de que ser “intelectual” e “Cult” é algo positivo e descolado, enquanto durante toda minha infância e adolescência, gostar de ler era sinônimo de gente esquisita, nerd e deslocado.

Mas me dê um momento para contar minha experiência com os livros e com produtos de papelaria. Se eu começasse minha história falando que era uma garota tímida, excluída, que amava ler desde criança, pois encara nos livros minha única companhia sincera, seria uma completa mentira. Para ser transparente com vocês, eu nunca fui tímida, mas também nunca demonstrei sentimentos próprios, eu tenho o costume de viver pelo sentimento dos outros, pois me sinto incomodando pessoas caso falasse dos meus próprios problemas. Dizem que tem a ver com meu signo, talvez tenha mais a ver com o fato de eu achar muito irritante escutar reclamações e também por seguir a risca a ideia de não fazer aos outros o que eu não gosto que façam a mim. De qualquer modo, nunca tive grandes problemas com comunicação, tenho uma personalidade que me permite rir de quase todas as situações e isso me faz, de certo modo, atraente a novas amizades.

O grande problema disso tudo é que, como a maioria das pessoas comunicativas, possuo uma mente hiperativa e criativa, o que me impede de focar, manter um diálogo por muito tempo e achar coisas cotidianas interessantes. Desde sempre criei universos em minha mente, criava histórias, mundos, amigos imaginários que fossem super-heróis intergalácticos e estudava qualquer época com deuses o suficiente para me manter distraída por algumas horas. Com a ajuda de minha mãe (esta sim, com as características de timidez que vocês estão acostumados para descrever apaixonados por livros), tive contato com livros de mitologia e minhas “histórias de nanar” se tornaram nos contos destas obras, fazendo com que meu primeiro contato com o mundo da literatura fosse absurdamente delicioso.  Foi nesse momento que minha paixão por livrarias começou. 

Para mim, uma livraria é como uma loja de doces para uma criança. Cheia de opções, gostos, estilos e vida. O primeiro diferencial é o cheiro, não importa qual loja você vá, qual espaço você frequente, o cheiro dos livros ainda é o mesmo, é como um perfume comum e é a mesma sensação de quando você passa muito tempo fora de casa e retorna só para sentir o cheiro daquele espaço. Não tem nada igual. As páginas, o cheiro da impressão, do estilo de papel utilizado, todos os detalhes são fundamentais nesse momento, é um momento de prazer quase sexual. Em seguida é o tato. Não importa se o livro te impressione ou não, não importa aquela famosa frase “não julgue o livro pela capa”, mesmo que você não vá levá-lo, pois o assunto não te interessa, toque-o. Sinta-o com a ponta dos seus dedos, são tantas opções que você se perde.

Finalmente há o momento mais importante da minha paixão, o motivo que durante muito tempo preferi-os as pessoas de verdade. Descobri nos livros a única coisa que consegue conquistar minha atenção por mais de uma hora seguida, que não me faz sentir entediada, ou desinteressada. Quando entro em uma livraria imagino quanto conhecimento existe naquele espaço, quantas histórias sem pé nem cabeça, quantos livros sobre autoajuda, sobre história da arte, história contemporânea, música, esoterismo, e ficções alucinantes sobre o mundo de robôs e pessoas gordas em cadeiras de rodas flutuantes. Não importa o que você procura, o que importa é que nada substitui àquilo, nem mesmo a Google. 

Minha história com papelarias não é muito diferente. Tem muito a ver essa história de mente criativa e hiperativa. Como criava histórias em minha mente, conversava com a parede e sonhava acordava, decidi desde pequena investir em “arte”: desenhos, poemas, contos, diários, pinturas, montagens, costura. Tudo e qualquer coisa que tivesse alguma relação a expressar minha criatividade, eu aprendia, se fazia direito ou não, isso já era outra história. O que importava era que eu me arriscava em qualquer coisa e finalmente conseguia, do mesmo modo que fazia com os livros, me manter quieta num mesmo lugar, me focando numa mesma tarefa, por horas e horas sem parar. E isso era delicioso, era o meu momento, era o momento que eu conseguia colocar para fora qualquer sentimento que escondia das pessoas, e foi exatamente desse modo que descobri minha vocação para a vida. 

Entrar em uma papelaria é buscar novos materiais criativos, é pôr na prática tudo que eu aprendi com meus livros. Tenho com cadernos e diários a mesma conexão que encontro nas obras da livraria – cheiro, tato e conteúdo -, a diferença é que com a papelaria eu invisto no conteúdo, o que me dá grande alegria.

Eu também tenho isso com canecas
E bolas de pular
E cremes
E sapos de pelúcia

Mas isso não se iguala.

A partir daqui você começa a me conhecer. Essa história é sobre essas duas paixões e a busca de uma maior, uma que dure e que fale coisas interessantes por mais de uma hora. Essa história não é só sobre mim, mas também sobre outras pessoas com as mesmas síndromes, com os mesmos desejos, que aprendem entre si e também com a ajuda de livros e cadernos.