segunda-feira, 26 de abril de 2010

Televisão

Ele zapeava a televisão, eram 200 canais e nada útil para se ver em uma tarde de segunda-feira. The History Channel, uma história sobre homens de preto, óvnis que matam pessoas. conspiração e fim do mundo. Tudo que ele queria era o fim daquele dia, só isso, o mundo podia facilmente esperar. Ele queria aquela máquina que faz tudo, qual era o nome dela mesmo? Juicer alguma coisa. Ela devia ser útil, rala, corta, espreme, bate. Aquele homem que falava na televisão tinha uma voz engraçada. Ele queria ter pagado o Playboy TV, ou aquele outro canal de luta. Talvez assim pelo menos ele se divertia de algum modo.

Sua televisão parou no TV Coréia. Quem ia ver esse canal? Claro, e o canal nem ao menos funcionava. E quem vai pagar a Net para ver a TV Coréia? Aquilo não fazia sentido. "Por favor, quero a Playboy TV, TV Combate e o TV Coréia". Tinha outro canal que parecia que eles falavam alemão, ou holandês, ou qualquer língua que ele não fazia ideia do que falavam. Era um homem careca, de óculos e terno e outro que parecia o doutor que falava sobre sexo no GNT. Não, e não era a velhinha tarada que passava de madrugada na GNT. Sue. Ela era bem tarada.

Tinha uma mulher bonita apresentando culinária no canal italiano. Mas ele passou rapidamente, já era hora do almoço e ele não estava com saco de pegar algo para comer. No SciFi Channel passava Star Trek, a série tinha sua idade e ainda passava. Ele sempre se perguntou quem assistia. Todo mundo já deve ter visto todos os episódios disso e aquilo era muito chato. Muito chato. Ele se arrependeu de novo de não ter comprado o canal Playboy.

Se apagasse a televisão, teria que trabalhar. Preferia o tédio da televisão, definitivamente. Pensou novamente naquele juicer. O programa dizia que cortava tudo. Devia ser útil. Era caro e ele não ia comprar frutas e legumes para experimentar o produto. Ele nem ao menos sabia cozinhar. A fome bateu de novo. O telefone estava longe e a preguiça era maior. Dane-se.

Talvez ele devesse fazer um regime. Olhou para sua barriga dobrada, pança. Bateu um dedo nela. Era engraçado. Ela parecia gelatina. Bloun. Mexia. Era a cerveja. Talvez ele devesse parar de beber cerveja. A cerveja tinha acabado, ele teria que sair para comprar. O miojo também e o feijão pré-pronto também.

Regime era uma boa opção. Dizem que se você para de comer, você continua engordando. Era como se seu corpo encarasse aquilo como uma mensagem de falta de alimento e lhe desse a gordura guardada para você ficar mais forte. Ele tinha estudado isso uma vez, mas não era assim. Se parar de comer engordasse, os caras da Somália seriam tudo gordinhos. Que mente sacana, cara. Eu vou para o inferno. Mas se você é ateu, não tem essa, certo?

Aquele pensamento lhe deu fome de novo. Ele viu a propaganda sobre um produto para filtrar a água da pia. Aquilo o lembrou que ele ainda não tinha tomado banho. Será que ele pegou a conta de gás? Pegar, ele pegou. Pagar é outra história. Ele tinha que comprar cigarro também e isqueiro. O gás do isqueiro acabou. Isqueiros Bic não são mais como antigamente! Acabou em um mês. Antes ele ficava com o mesmo isqueiro durante meses.

Por que todo mundo começa a pensar em mudar a vida em uma segunda-feira? Teoricamente o a semana começava no domingo. Ninguém pensa em mudar a vida no domingo. Domingo é dia nulo. Faustão. Faustão tinha feito uma cirurgia para ficar magro. Se até o Faustão fez isso, talvez ele realmente devesse fazer regime. Será que o Faustão está usando aquelas cintas engraçadas? Aquilo deve feder, o dia inteiro com a mesma cinta, 30ºC na rua. Banha e suor.

A Net saiu do ar. Nem a Globo funciona. Deve estar passando Chaves no SBT. Ele lembrou da matéria sobre o Quico que leu no Estadão essa manhã. Aquele cara tava velho, as bochechas dele estavam parecendo de um cachorro. Por que esses caras nunca sabem a hora de parar? Tudo que ele queria era a aposentadoria e tudo que o Quico fazia era trabalhar. Gente doida.

Na matéria falava de cachorro quente. Algo como cinco reais para um cachorro quente. Muito caro. Mas agora ele pagava. A fome estava apertando. Ele olhou para os pés. Tinha que levantar. vai, coragem, pelo menos até a geladeira, deve ter um macarrão velho do dia anterior com um molho já estragado. Ele se levantou devagar, aquele gemido de saco cheio. Passos curtos, corpo para baixo. Gravidade é um saco, parece que te joga no chão. A barriga fazia aquele barulho engraçado a cada passo.

Ele desligou a TV. Energia era caro. Mais tarde ele ligaria para o canal de compras. Talvez um juicer fosse um incentivo para um regime. Tem aqueles produtos de exercício também. Além disso, ele podia fingir que não deu certo e pedir o dinheiro de volta depois. A banha dele era mais do que a prova de que os produtos não funcionaram. Boa ideia.