quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Lunática

Olá a todos... Eu prometi postar um texto sobre o cansaço psicológico, no entando terminei agora de escrever um que conta sobre isso mas de uma visão diferente. Talvez gostem!

Beijos e abraços,

Da Autora.

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- A Lunática -


“Você quer morrer?”, ele gritava do outro lado da rua, se eu quisesse realmente morrer, não estaria fazendo aquilo, o motivo era outro, bem melhor. “Muito pelo contrário! Eu quero viver!”, berrei, libertando aquele desespero que estava em minha garganta durante meses. Uma buzina tocou, bem em meu ouvido, desviei rapidamente da primeira moto que passou raspando em meu braço.


“Sai daí!”, ele insistiu desesperado. Oras, se eu não estava preocupada com aquilo, por que ele, que mal estava no meio da rua como eu, deveria estar? Eu só queria sentir, queria sentir a vida dentro de mim, pulsando, aquela adrenalina toda gritando em meu corpo, a falar em grito: “Sua maluca!”, um carro passou perto de meus pés, “Sim!”, foi o que gritei de volta, era totalmente louca, a sanidade era a última das minhas escolhas para a vida!


Eu sorria, um sorriso limpo e livre, tudo porque eu a sentia, sentia a vida pulsando em mim a cada carro e moto que passava pelo meu corpo, quando eu ainda estava no meio da rua, implorando para nenhuma pessoa sã me tirar de lá. “Por quê?”, ele gritou novamente.


Como se eu pudesse realmente explicar em palavras o motivo disso tudo, por quê? Porque cansei daquilo, ah! A falta de vida, a mesma rotina, os mesmos passos, as mesmas pessoas. Às vezes é necessário pirar, sair do ar, esse era o momento. Saber que existe um coração dentro de mim e a qualquer momento ele pode parar de bater. Virei meu rosto para vê-lo, VRUUUM!, um ônibus colou em meu corpo, me arranhando o rosto, fazendo-o sangrar. Eu ri, nossa, aquele sangue quente escorrendo de meu rosto!


Olhei para o céu, sem nuvens, vento frio. Era São Paulo, não devia esperar mais daqui, o vento cortava mais meu rosto, era gelado e seco, mas eu não me importava. Já havia jogado meu casaco e meu cachecol no meio do caminho para o meio da rua (quanta utilização de “meio”!). Meu corpo estava quente, se não fosse vulgar, provavelmente tiraria o resto de minha roupa, porque o calor vinha de dentro para fora e queimava meu corpo, como nunca tinha presenciado antes.


Olhei para ele e sorri, meu sorriso mais normal (se bem que todos meus sorrisos são um pouco anormais). “Quero testar uma teoria!”, gritei abrindo os braços, sentindo uma moto quase arrancar um. “Uma vez”, comecei a falar para ele, aos berros, “me disseram que quando você é atropelado a primeira vez”, eu já fui atropelada uma vez, “a segunda não pode acontecer!”. “São como raios! Não caem no meio lugar duas vezes”, respirei fundo, “só que no meu caso, uma pessoa não pode ser atropelada mais de uma vez na vida”.


Claro que minha teoria não tinha fundamento algum, era totalmente inventada. Por acaso, havia inventado na hora, simplesmente para que ele compreendesse pelo menos um motivo pelo qual eu resolvi ir para o meio da Avenida Paulista me misturar aos carros, motos e ônibus.


“Saia daí, por favor! Volte!”, ele implorava já aos prantos. Por que ele estava chorando? Eu não sou tão importante assim!


NÃO!


Gritei e pensei, alto, muito alto. Buzina novamente, um grito: “Sai do meio da rua, sua filha da puta!”, que educação! Motorista, por favor, o estresse mata.


POW!


Hum, agora foi de verdade... Minha teoria estava errada, é uma pena, era uma boa teoria! Um carro passou em cheio em meu corpo, em alta velocidade, quando vi, estava no ar, choques, choques, choques, devo ter batido em todo o caminho do carro. Olha, isso dói.


Depois? Depois estava no chão, engraçado... Durante todo esse tempo que estava na rua, nenhum carro parou, continuaram a andar, sem se preocupar com uma lunática que estava tentando passar por entre os carros. Estavam atrasados.


Até o momento em que algo aconteceu, até o momento que alguém resolvera passar sobre meu corpo para ver se aquilo terminava logo, nesse momento todos os carros pararam. Eu não sabia exatamente o que estava acontecendo, se eu queria sentir a vida, agora tinha conseguido com toda certeza. Agora sentia cada parte de meu corpo.


Percebeu que as pessoas valorizam mais a morte do que a própria vida? Porque todos já haviam saído de seus veículos e agora estavam em minha volta, eu via sombras, muitas sombras. Todos me olhando de cima, alguns com celulares na mão, tentando chamar alguém para me resgatar. Antes nem ao hospício eles chamaram!


Nossa, aquilo era a vida. Ou melhor, o finzinho dela. Como se eu realmente tivesse me importando, eu era insana mas não burra. Eu sabia que em alguma hora um carro ia tomar coragem e eu não ia conseguir desviar, na realidade... Eu acho que não ia querer desviar.


Era óbvio que ele estava lá, ajoelhado perto de meu corpo e chorando. Meu Deus! Que homem chorão! Eu que fui atropelada e não estou chorando, por acaso, eu estou tentando sorrir, mas meus músculos doem. Tem algo estranho, parece uma poça de sangue. Eu ri, ou tentei. Meu riso saiu mais estranho que o normal.


Eu falei, meu sorriso já é macabro naturalmente, meu riso é algo como aquelas risadas maléficas de desenho animado. Dessa vez ela saiu ainda mais grossa, talvez pelo jato de sangue que logo após tive que cuspir.


Meu peito doía, nossa, parecia que eu estava sendo empurrada para o asfalto com ainda mais força! O que era aquele barulho? Que eficiência! Acredita que a ambulância já estava aqui? Eu não... Eles sempre demoram, dessa vez foram tão rápidos. Ah! Mas eu não queria ir.


Só porque agora eu tinha descoberto como viver realmente? Droga! Ih, senti algo me tocar... Ah, era o médico. Esses homens de branco que parecem que tão cuidando do cachorro deles, não de uma pessoa realmente. Não toca ai! Ta doendo!


Olha só... Uma maca! Hum, não consigo respirar. Desliga essa maldita sirene! Tá me dando dor de cabeça! Eu queria dizer algo, mas não me lembro... Era algo sobre a vida... Mas que assunto mais batido! Talvez eu fale algo sobre a... hum... a... eu...

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“Morta”, disse o médico ao rapaz que estava junto ao corpo da mulher. “Como assim? Por favor, não me diga isso!”. “Não podemos fazer muito, a pulsação dela já se foi...”.


Depois era somente o som dos “oh” e dos “ah” das pessoas envolta do corpo e das lágrimas do homem ajoelhado ao corpo da lunática atropelada.


Um comentário:

Gustavo Di Lorenzo disse...

Gostei desse :D
até criei uma simpatia pelo cara chorão.